Marcelo Odebrecht pagou R$ 66 mi em imposto de renda sobre multa do MPF

16/1/2020 às 19:48:11  

Por Graziella Valenti — De São Paulo

Marcelo Odebrecht pagou à Receita Federal R$ 65,6 milhões em imposto de renda sobre todo o pacote financeiro que recebeu da companhia, no total de R$ 217 milhões, como exigência para assinar o acordo de colaboração premiada com o Ministério Público Federal (MPF).

A mordida do leão foi honrada em março de 2019, após consulta formulada pelo próprio ao Fisco. O total desembolsado inclui a incidência da alíquota
de imposto de 27,5% sobre a multa que as autoridades aplicaram à Marcelo e que foi assumida pela empresa.

Essas informações, que vieram à tona devido ao acirramento da disputa entre o grupo Odebrecht e seu ex-presidente, trouxeram um fantasma tributário que agora assombra os demais 76 delatores do conglomerado. Todos os colaboradores tiveram
as penas pecuniárias honradas pela empresa, mas só Marcelo recolheu imposto.


Marcelo recebeu um pacote de benefícios diferenciado da Odebrecht, como imposição para aceitar fechar o acordo com as autoridades. A existência desse contrato entre Marcelo e a Odebrecht foi revelada pelo Valor em dezembro. Do total desse pacote, R$ 73,4 milhões referem-se à multa aplicada pelo MPF.

O herdeiro minoritário do conglomerado, primogênito de Emilio Odebrecht, fez a consulta à Receita Federal em 2017. Obteve a resposta em dezembro de 2018 e pagou o imposto corrigido em março de 2019, conforme o Valor apurou.

Quando fechou o acordo de leniência para a companhia e para seus 77 colaboradores, a Odebrecht estudou a questão tributária - assim como outras empresas na mesma situação, alvos da Operação Lava-Jato, conforme fontes envolvidas com o tema.

A leniência corporativa é a soma dos relatos das pessoas físicas e os acordos, portanto, são interdependentes. Por isso, a Odebrecht é juridicamente solidária nas responsabilidades dos colaboradores. O entendimento que prevaleceu é que, em razão disso, os pagamentos das multas das pessoas físicas assumidos pela corporação
têm caráter de indenização e, por isso, deveriam ser isentos de tributação.

Há uma diferença prática entre o caso de Marcelo e dos demais colaboradores. O expresidente foi o único que recebeu valores do grupo para assinar o acordo, em 2 de dezembro de 2016. Os demais, tiveram as despesas - com multas e advogados - arcadas pela companhia, mas sem que houvesse depósitos em suas contas.
Marcelo exigiu, em novembro daquele ano, que a companhia depositasse previamente a ele R$ 70 milhões, para compensar perda de patrimônio, e mais R$ 73,4 milhões da multa que deveria honrar com as autoridades. E recebeu.

Nenhuma dessas quantias foram para contas pessoais do ex-executivo, mas sim depositadas em nome de sua
esposa e filhas. Ainda naquele mês, portanto, ele recebeu R$ 143,5 milhões.

Esse valor foi ampliado logo em seguida, com aditamento ao acordo original, mas ainda em 2016. Como exigia que seus benefícios fossem livres de impactos fiscais e também quis assegurar cobertura para eventuais novas penas fora do Brasil, Marcelo
acordou que a Odebrecht pagaria diretamente ao MPF sua multa de R$ 73,4 milhões e ele ficaria com o depósito que anteriormente teria essa finalidade. Com isso, o totalrecebido da companhia chegou a R$ 217 milhões.

À Receita Federal, o ex-presidente listou, sem expor valores, todos os recebimentos que obteve da companhia, mais a multa paga, e defendeu o entendimento de que teriam todos caráter de indenização - pois não caracterizaram acréscimo patrimonial, só compensação de perdas - e que, portanto, seriam isentos.

Os demais 76 colaboradores não foram compensados pela perda de bens imposto pelo MPF, além das multas. As autoridades proibiram essa compensação. Também não obtiveram nenhuma reserva adicional para eventual discussão tributária, como exigiu Marcelo previamente, e o recurso relacionado à multa não transitou por conta pessoal de ninguém.

Mesmo assim, a resposta da Receita Federal deixou os demais colaboradores que souberam do assunto de cabelo em pé. Fora da Odebrecht, outras companhias que enfrentaram situação análoga estudam a consulta feita por Marcelo, conforme o Valor apurou.

Na resposta, o Fisco não faz nenhuma diferenciação entre o acordo de Marcelo e os demais, pois isso não foi tema do questionamento. A Receita Federal apenas se limita a defender seu entendimento de que, em razão do Decreto 9.580, de 22 de novembro de
2018, há um novo Regulamento do Imposto sobre a Renda. E que, no caso da consulta específica, não foi apresentada nenhuma “comprovação fática ou jurídica” que possibilitasse o enquadramento dos recebimentos como isentos e, por isso, não alteraria “em nada a constatação de que a pessoa que recebeu esses pagamentos teve acréscimo de patrimônio”, sem importar a destinação dos recursos.

Até o momento, não há conhecimento entre os especialistas de que a Receita Federal tenha cobrado ativamente nenhum colaborador - da Odebrecht e de outras companhias - pelas multas pagas ao MPF pelas empresas. Além disso, o entendimento da Receita não é vinculativo - ou seja, ele vale apenas para Marcelo.
Especialistas consultados pelo Valor, contudo, acreditam que o melhor seria se houvesse um posicionamento da Receita Federal a respeito do tema para eliminar qualquer tipo de incerteza - tanto para acordos celebrados recentemente quanto
futuros.

Fonte: Valor Econômico
 
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